Diz o dito popular: A cavalo cego não se dá milho. Sempre achei esse provérbio uma tremenda injustiça contra um animal que, depois do cão, é o segundo amigo do homem. Em minha opinião, de maior serventia, pois, além de trabalhar muito, não morde, salvo em raras exceções.
Na cultura popular, há várias anedotas que envolvem a família dos equinos. Umas boas; outras de péssimo gosto. Prefiro a do meu tio que costuma repreender a mulher usando uma frase muito engraçada. Cala a boca, Maria! Quem conversa muito dá bom dia a cavalo!
Recentemente, parti de forma heróica em defesa de um pobre cavalo. O coitado estava preste a se tornar jabá por um acidente que não teve a menor culpa. Pelo contrário, carregou uma pesada carroça, contendo nela sete marmanjos engravatados.
O fato acorreu no casamento caipira de 2008, na estrada do Povoado Alecrim, em pleno cortejo nupcial junino. Por onde passavam, eles, os engravatados, arrancavam aplausos das pessoas que de suas portas assistiam ao encenado matrimônio, no entanto, as mais animadas eram as donzelinhas que ainda sonham com carruagens e castelos de fadas.
Havia um prêmio para a carroça mais enfeitada, todavia, os componentes dela foram além, queriam ser os mais bonitos da festa, por isso, exageraram no manequim. Trajaram-se todos a rigor. Usavam camisas listradas, longos chapéus, calças jeans e, nos pés, botas caprichadas.
Pela estrada sinuosa do Alecrim, seguia a turba em convulsão. Mas no meio do caminho, tinha um desvio. Desvio estreito e lamacento. Cheio de pedra e escorregadio, naquele domingo chuvoso e muito frio. E o cavalo andava. Não estava contente, mas transportava os engravatados que de cima da carroça, acenavam para o público que os aplaudia. Fizeram tudo bonitinho, mas não avisaram nem ao cocheiro nem ao cavalo que na estrada havia um desvio.
E, lá se ia uma velha carroça puxada por um cavalo, levando sete moços engravatados, numa estrada muito perigosa com destino ao Alecrim. Era um turbilhão em alegria, cenas em cores variadas, tudo ao estilo rural, bem ao gosto da festa, porém, esqueceram de avisar ao cocheiro e ao cavalo que na estrada havia um desvio. Após a descida do Pau-que-Chora, a estrada principal estava interrompida, por isso, entraram à direita em direção à Mata Verde. Era o sinistro desvio que nem cocheiro nem cavalo conheciam. E o cortejo caipira seguia com destino ao Alecrim.
Os engravatados bem alegres gritavam ao cocheiro e ao cavalo que andassem mais rápido, corressem, voassem, se possível, queriam ter primeiro lugar em tudo.
Numa curva, na parte mais estreita do caminho, muita lama, ponta de pedra afiada, solo escorregadio. O cavalo em velocidade máxima. Os passageiros engravatados vibravam em euforia. Um buraco no meio da estrada, uma puxada para a direita e... Cavalo com carroça e passageiros despencaram-se paredão abaixo.
Era o fim da linha, ou seja, da viagem. Agora, o cenário é horrível, a carroça está com os pneus pra cima, o cavalo deitado com as pernas pro ar e os donzelos engravatados surgem dos pontos em que foram atirados. Um de uma poça de lama; outro de uma touceira de espinho; detrás de uma moita, surge alguém. Estão em desalinho. Até as gravatas foram amarrotadas.
Ali marcava também o fim do sonhado prêmio. Culpa do cocheiro! Falou alguém. Minha não! Respondeu ele. É culpa do cavalo! Do cavalo? Como assim? Será que vocês não viram que o cavalo é cego do olho direito?